Quando ligo o rádio nunca sei quem toca
Olho para o cinzeiro: daqueles em barro pintado, largos, pesados, e com o Y invertido mais-a-perninha, o velhinho símbolo do "Peace and Flowers".
Quando. Quando não desaparecido entre maços de tabaco amarfanhados e piriscas, despercebível dum símbolo comercial qualquer, mais um indiferente cinzeiro de oferta publicitária. Um pouco como o poster do Guevara na parede do quarto, e outras Fátimas.
Woodstock. No Scala havia gravadores na plateia, daqueles semi-caixotes para cassetes em malinha à tiracolo. Então melhores que os i-Pods são hoje, aposto. As músicas ouviam-se mesmo. Quando o movimento hippy, freak, ainda antes dos derivados, existia e este símbolo era indespercebíbel, inconfundível fosse em entalhe no tronco duma árvore - deixei alguns no 'mato', por exemplo a caminho do Bilene ou do Xai-Xai - um desenho numa folha, ou fosse onde fosse. E ele abundava... Um sorrir enorme e florido que já não há, eis, verdete de tudo envelhecer, ele e as flores... não, não é patine, é tom de verde o que mirrou o símbolo.
Woodstock, the movie: o solo de bateria quando o Santana estava no palco. Do Jimmy, louco de todo. Todos. Do filme mostrar a fenomenal ressaca da segunda manhã, pois 'duas' seguidas mais os preparativos viam-se, e do lado de cá e de gravador em punho e peace & flowers erguidos muito, muito cá dentro, tanto que enchia o peito de alegria, soavam maravilhosas imagens que mostravam em como a FESTA 'estava' a ser muito, muito melhor que a víamos no cinema. Existiam coisas assim: víamo-las, cassete ligada. "E se eu, um dia...?"
Mais: Genesis e o seu maior álbum, 'Nursery Crime'; Jethro Tull à boleia para a Namaacha, com mais duas cassetes que se estragaram: Aqualang a soar ao longo de quilómetros e quilómetros, mochilas vazias às costas e dedos em "peace, man!", é para nunca mais esquecer; Floyd e 'Arnold Layne'; 'Evil Ways' em viola acústica; muito 'Yes', sei eu lá porquê quando hoje pego no álbum; D. Purple; Black Sabath; Uriah Heep (!!) e esse monstro que é 'Demons and Wizzards', coisa mais speedada não há. Estou louco.
Loucos foram os que combinaram fumar tonelada de 'jardas' em volta do Pentágono, assoprar, e dar-lhe um pouco do que manifestamente lhe faltava, elevá-lo no ar até ele compreender e falar, e por exemplo dizer "mais Vietname não". Isso, isso em que estás a pensar: hoje um gajo que fume um Marlboro ou outro mata-ratos qualquer arrisca-se a ir de cana. E há o outro, há Iraque.
Ou talvez não, talvez não fossem loucos: li há tempos e sei lá onde, sonhei, que há sobreviventes e contam, em caravanas e longos cabelos, e onde os cinzeiros ainda estão limpos, visíveis e identificáveis, lindos na sua patine, que contam em como ele se elevou ainda, não muito mas subiu um bocadito.
Viram. Eu só vejo que quando ligo o rádio nunca sei quem toca.
Um dia destes vou-me embora.
(imagem daqui)
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