sábado, agosto 26, 2006

Auto medicação

Informo que me estou nas tintas para o "caso Mateus".

Plutão

Então e os direitos adquiridos?

sexta-feira, agosto 25, 2006

04.00 pm

Numa cidade de cascos cinzentos e fardas brancas solta amarras o meu marujo, em trajecto transatlântico embrulhado na bandeira imperial dos falcões dos mares e dos ares, que farda e disfarça as mil e tantas lutas pessoais que acasamata no seu opulento bojo. Como a dele, meu único herói.
Com precisão e aparato militar o mastodonte das águas solta cordame e navega, e com a precisão sentimental de quem sente o nó paternal apago a puta da lágrima e mando à espuma e aos ventos berro à cria, únicas palavras audíveis que em tal porto e neste atoleiro emocional posso em consciência articular: regressa rapidamente e são, meu filho!

quarta-feira, agosto 23, 2006

Lourenço Marques: eu e a cidade (I)

(...)
Lourenço Marques era o centro do mundo, latitude e longitude de mim. Além dela, cidade, em miúdo sonhava a selva e os seus mistérios, filhos de romances húmus de imaginações, e quando os calções deram lugar às calças à boca-de-sino e estas se motorizaram descobri que a temida selva das tardes lidas em tantas páginas afinal eram planícies imensas de capim, picadas que só não eram intermináveis porque desistia de as seguir e acoitava-me em sombras olhando a felicidade de turistar o mato, praias que só soube quão belas eram quando as perdi, vilas pachorrentas com o pé das árvores caiado de branco e onde as portas e as janelas tinham todas redes mosquiteiras, aldeias de caniço à sombra de mangueiras onde a chegada da minha motorizada era o acontecimento do dia e fazia gritar de excitação os miúdos, cantinas à beira do alcatrão onde dessedentava o arrojo, o mundo além do meu mundo, cidade. Dela partia e a ela tornava, silhueta e sombra queridas, meu ninho e refúgio, minha cidade, única metrópole que me falava ciciando-me promessas de mais assim, eterno assim, romance de enredo empolgante que lia com sofreguidão expectante das páginas do dia e da noite seguintes, numa insónia colonial mesclada pela névoa doce dos anos do crescer.
Cidade. As picadas citadinas eram avenidas imensas ou ruas recantos, entre prédios gigantes que agigantavam o horizonte e tornavam brilhante o rubro das acácias e cintilante o azul dos jacarandás ou velhas moradias onde nas frestas das janelas se viam os escombros das redes mosquiteiras, brasões do passado em guaritas de modernidade, assim era Lourenço Marques cidade cimento, mausoléu imperial, mágico sepulcro da infância e juventude e que em culto de memória venero, como se beber da taça da fonte da juventude fosse inócuo e tão seguro como ler um romance que fala do passado, certo que a estante o arquivará.
Filho de colonos modernos, da leva que despida do rótulo não prescindia do espírito do estatuto, aportei ao cais Gorjão com os olhos abertos de espanto e uma curiosidade sem fim: sete anos, os especiais sete anos, tempo em que a escola era encanto e não rotina a abreviar sempre que possível, tempo para começar a acreditar nos sonhos que as letras contavam, tempo de descobertas dos mundos imaginados. O cenário ideal: afinal o sonho estava além presente, seja ele vestido das fascinações urbanas ou lido e adivinhado nas feitiçarias rurais, lá depois da linha de horizonte onde os romances de aventuras se escrevem. Porque a vida calha assim morava na terra de ninguém, naquele vasto e ignorado hiato entre uma e outra cidade, ricos caniço e cimento, ricos no tanto que genuinamente me davam. Da pobreza? li esse romance depois, então estava ocupado em crescer e a banda desenhada onde o sol se punha com raios e matizes que atraíam era irresistível, ocupado a tempo inteiro em turistar de mim além do tal horizonte, viver antes que a biblioteca fosse necessariamente outra. Naquele pedaço de tanto em que uma cidade morria em tentáculos de cimento que penetravam na urbe do seu outro lado do espelho, lá onde os transportes colectivos são tão apinhados como os de qualquer outro subúrbio onde o meio-termo junta a cor aos cifrões, nessa densa picada urbanizada onde as árvores não estavam caiadas de branco e as redes mosquiteiras cumpriam a sua histórica missão de falar aos visitantes do atraso social, na arriba entre a Mafalala e o Alto-Maé assentei dias e noites, amigos, paixões, birras ou brincadeiras, vivi os primeiros sonhos eróticos sonhando com a prostituta da barraca ao lado e não com a gentil menina da flat do quarto andar, assim vivi, aprendi e cresci durante uns sete, oito anos, até família e mobília mudarem-se para dentro da outra cidade, e demorei a sentir o Malhangalene como terras e passeios que pisava com segurança, meu bairro ‘minha cidade’. Sentia-me em visita permanente, como que em quintal vizinho onde se brinca antes de, quando o descanso reclama pela segurança-mãe, acamar os repousos lá ao lado, ‘em casa’, e amanhã há mais. Foi uma época de viragem, aos quinze já se pensa que a masturbação pode ser substituída e já se viram umas fotos sobre o assunto, tem-se vergonha de se ter usado calções até há tão pouco tempo e já se rouba um cigarro com mais descaramento, odeia-se a escola e aspira-se à independência. A cidade fascínio passou a ser vivida por dentro, perderam-se os tempos em que o carro do pai adormecia à porta de qualquer evento com presença arrancada a ferros, mas sob condição de protector transporte personalizado, paternal. De repente os transportes públicos eram de maior oferta e confortavelmente mais vazios, a ida aos jogos nocturnos de basquetebol ou de hóquei em patins às quartas e sábados à noite acelerou-se tão depressa como a bainha dos calções descia, vestia as calças da cidade-toda e corria pelos passeios no passo alegre de quem ascendeu a vizinho das lojas e das montras onde os fascínios se vendem, acreditando que um dia poderia comprá-los todos, sonhando Lourenço Marques como minha mega e privada diversão.
Em casa era como em todas as casas, uns dias assim e outros assim-assim, a minha disciplina escolar rondava a fraca percentagem da do aproveitamento académico e rapidamente foi imposto um regime misto, aulas nocturnas e emprego assegurado por providências paternas, no louvável intento de dar um rumo de avenida à esburacada picada do meu futuro. Nem meio ano depois estava a sinalizar a compra duma motorizada, passado outro arrendava a meias um apartamento com o grande amigo de escola e agora também um colega de serviço, o Luís, igualmente exilado para os redentores rigores da vida de trabalhador-estudante por sagazes providências paternas, que casavam na perfeição com a certeza de que qualquer actividade que fosse nocturna era sempre mais atraente que a sua versão ensolarada, mais adequada para outras coisas como por exemplo trabalhar e ganhar um ordenado, sacra independência económica e intuitiva mãe de todas as outras. Até o fim da masturbação se tornava mais visível no sedutor húmido horizonte, graças à motorizada e às calças novas, o bigode, a barba e a mosca crescendo dia-a-dia, e importantes lecas no bolso. A farsa das aulas nocturnas durou um ano, num instituto particular no quarteirão entre o Rádio Clube e a 24 de Julho, perto do consulado britânico e da cervejaria ‘Cortiço’, e rapidamente o pater familias anuiu a que o “horário único” laboral que tinha, das sete à uma, passasse a pormenor entre todo o restante, contínuo e folgazão relógio q.b. conforme ventos e humores. Vida escolar assim abreviada e supunha-se terminada, crente que por tal términos passava o desejado fim do crescer, rejubilava pessoalmente cada etapa vencida. Passava tardes no cinema e vagueando pelos cafés, muitos que já frequentava enquanto cumpri outro ritual da época que era neles estudar, principalmente em vésperas de pontos e assim pretexto não contestado familiarmente para uma saída nocturna em dia de semana. Assim que tive a motorizada havia tardes em que ia à praia ou perdia-me em longos passeios pela cidade, descobrindo-lhe as curvas e as intimidades, o que inclui os desvarios dos idílicos e insatisfeitos quinze anos, as atracções pelos proibidos da moda, rebeldia igual a ontem hoje e amanhã.
Então em absoluto, Lourenço Marques era o centro do meu mundo e o romance de viver era como se lido às escondidas, à procura das páginas proibidas, lânguidos beijos e múltiplas paixões escandalosamente contadas na sua sagração carnal, mas o pôr-do-sol benzia a inocência de todos os pecados se visto do jardim perfeito e com o forte aroma da suruma circulando de mão em mão, o horizonte brilhando em cores especiais nessa paleta única do ocaso do dia africano. Assim eu namorava a cidade.
(...)
(extracto do meu livro nunca acabado, parte passada a acta esta tarde)

segunda-feira, agosto 21, 2006

dedos que sabem escrever

íntimo

O que se lê nos olhos dum filho é sempre especial, leitura terna demais para a voz a soletrar. Mesmo numa foto, um pedaço de papel que de repente ganha uma importância especial, há novos pixels de brilho que fazem esquecer distâncias e os dedos tacteantes acariciam o olhar, esse mar de amor que para pai ou mãe só os olhos dos filhos têm e onde só eles sabem nadar, este lago de ternura imensa que me lava quando te capto o olhar sonhador, sorridente, olhando o futuro, construindo o crescer e o afirmar. Boa sorte Miguel. Regressa quando puderes. Regressa: afinal só mesmo isso é que é fundamental.

domingo, agosto 20, 2006

"fazer a mala"

(da primeira à última linha é ficção com excepção das mencionadas ofertas blogo-amigas, que ainda há quem também acredite que as melhores realidades são as antes sonhadas)

Uma mochila com duas camisas e umas calças, um necéssaire para os mínimos da higiene. Como vou de sapatilhas ou sandálias não preciso de meias e quanto a trapos íntimos vão somente três ou quatro cuecas, dois lenços de bolso. Sim, levo a máquina fotográfica comigo mas dispenso qualquer mapa – digo com desdém presunçoso… Por segurança face ao intermodal que tenciono praticar na viagem vai igualmente um rolo de papel higiénico e uma garrafa de água. E chega, que as minhas costas nunca foram especialmente robustas e os anos já ninguém lhos nega, principalmente eu que tenho momentos em que os sinto bem presentes.
Na sacola de tiracolo, a minha habitual mini mochila onde cabe tudo, vão somente os documentos e o money, um livro dos grandes para as muitas horas até aportar ‘lá’, mais os óculos suplentes/de sol, o Moleskine e duas canetas, um utilíssimo canivete suíço (nem que só seja para ajudar à ficção ele é indispensável, absolutamente!), e talvez um mini guia de conversação em inglês para facilitar qualquer atraso ou complicação no apanhar o 'chapa' para ‘lá’, quando sair do pássaro de ferro; não esquecer duas ou três doses de medicamentos para emergências pessoais possíveis de virem chatear. Acho que não preciso de mais nada pois o tabaco e os jornais compram-se pelo caminho.
Agora o guião dos saltinhos até chegar a Maputo: a incógnita ainda está no primeiro, daqui até Londres, Heathrow mais precisamente: já sondei o meu vizinho Zé Folgado que é camionista de longo curso mas ele não tem feito viagens para Inglaterra. Em lowcost de companhias aéreas caio sempre num dos maiores perigos desta coisa de nos aventurarmos para longe de casa que é o andar de avião: tempo para filosofar no porquê de certas espécies animais terem nascido com asas e outras não chegar-me-ão as muitas horas Londres- J’burg. Daí a Maputo poderá ser em ‘chapa’ que, já me soou, rondará os 50 USD, e encho a barriga de paisagem rural africana. Quanto à tal primeira parte, de Almeirim a Londres, essa ainda está indecisa e se calhar é desta que faço uma versão compacta do inter-rail, big túnel da Mancha incluído para dar azo a esgalhar uns tramas romanceados quando, já então vero madala, olhar para a mochila e recordar a aventura de aos cinquentas regressar a Maputo. Pensando melhor, quer a primeira como a terceira parte da viagem poderão e deverão ser em comboio pois por cá e no início vou nele de casa até Heathrow, e de J’burg a Maputo também é viagem com vantagens se comparada com em machimbombo, o ‘chapa’: os comboios têm uma magia própria, e uma viagem neles por “meia” Europa e pelo sul de África serão sempre tão recheadas de pormenores peculiares que forçosamente serão mais ricas e inesquecíveis que num enlatado aéreo. Nada de ‘Blue Trains’ (lá) e TGV’s (cá), que são andamentos fortes demais para o meu arcaboiço: em comboio ‘normal’, expressos, é sempre uma viagem confortável e nada por aí além que ofenda o orçamento à minha mochila.
Não falta quem blogue-ajude e empurre a este “mind-bungee jumping”, sei lá se salto com elástico resistente q.b. para a minha mochila aguentá-lo ou não… há p’raí já um ano que tenho oferta de “cama, mesa e roupa lavada” e mais recentemente houve quem falasse em “caranguejo et al”... Mesmo quanto à tal terceira e última etapa, se na primeira hipótese que coloquei era o ‘chapa’ o meio de transporte a utilizar, muito recentemente ficou a esvoaçar possível alternativa personalizada, pelo que é melhor juntar mais roupita à mochila pois isto já se assemelha a bloguista ‘visita de estado’ e não será de bom ponto reentrar em Maputo com a mesma pose e visual com que de lá saí, então ainda LM, aos tais trinta anos atrás :-)
O importante na bagagem é quem a carrega, a vontade de guiar os passos, o sonhar ser motor que possibilita vir a acontecer o milagre de reencontrar os pedaços dos fios cortados tanto tempo atrás, e tentar dar os nós possíveis a um hiato de trinta anos; perceber pontas da história pessoal que são incómodas no pronto-a-vestir do quotidiano, quiçá as obsessões e a recorrência de certos sonhos, o porquê de alguns resmungos, tantos públicos mas muitos mais que ficam íntimos, quer duns quer doutros. Até porque – e comecei por escrever assim, as melhores realidades são as que foram antes saboreadas em sonho, mochila feita com vagar e gosto e recheio sonhado peça a peça carinhosamente arrumadas no melhor bocado do dia, o da hora dos sonhos e das ilusões. Eu em Maputo 'um dia destes'? talvez, talvez... ora deixa cá ver: duas t-shirt's e os documentos, o raio do money, o cadernito e a caneta...

quarta-feira, agosto 16, 2006

photoshop necessário: I - cores primárias

(o vazio)
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A foto que se deveria ver e que não se vê (presumíveis razões técnicas), mostra uma lágrima a deslizar no mar. Uma lágrima a deslizar no mar? os homens chamam-lhe 'tsunami' e choram quando a vêm chegar. O planeta chama-lhe lágrima e ele, estóico, só chora quando o fazem chorar. Está tudo na foto que, afinal, não está visível quando deveria estar. Tem tons de azul ultramarino, manchas de verde sienna e nos picos da lágrima rolante brilha o alvo branco titâneo, enfim, as usuais cores do pranto no mar.
Conta a lágrima que, à nascença, ainda era mais feia que na imagem se pode observar: roubaram-lhe os verdes e os castanhos, poluíram de maus tons as cores primárias da sua elementar natureza e nasceu-lhe tanto cinzento que ele, o planeta, não resistiu às dores do seu espelho e pôs a sua paleta a chorar. No seu leito de mar verteu as lágrimas azuis deslizantes, gerou os azuis, os verdes e brancos puros que os olhos dos homens olham e sentem na foto (ausente?) como ameaçadores, encheu (o vazio) com a sua presença e, aos gritos de 'tsunami! tsunami!', finalmente pôs todos a olhar.
Ainda ausente, a foto? técnicas, as razões que levam uma lágrima a deslizar na tela do mar?

:-(

Infelizmente deixei de conseguir editar imagens. O vazio assume-se.

Almeirim-Manchester

Tu! tu que estás a ler, tu o momento mágico de ontem, tu ouve-me e guarda este sentir: dos últimos viveres, foram das horas mais lindas em que respirei e sorri, bem acima de qualquer outro nada ou outro tudo, tese, mestrado ou simples curiosidade: a alegria de, num nome desconhecio, encontrar um dos tais amigos que fará sempre falta encontrar para reavivar fés na espécie humana, acontecer a felicidade de fazer um novo amigo e ele ser um dos seus melhores espécimes, olhos sensíveis e doces, curiosos, cultos, naturalmente muito inteligentes. O tal 'sonho' porque graça impensada e imprevista, a empatia aureolando as horas que se tornam tristemente curtas, um Amigo acontecer.
Logo ontem à noite, quando cheguei finalmente a casa, quer hoje nestes momentos de intimidade connosco próprios em que se sorvem e lambem as últimas gotas ao pós-cálice, só encontrava e encontro uma palavra que conte do baque que senti : foi um sonho, esse momento mágico que é o pós-doutoramento do existir, o momento raro de nuns olhos antes desconhecidos encontrar afinidades, tantas, gerarem-se cumplicidades e soltarem-se sentires, radiantes filhas do baile da solidão. E aconteceu contigo, conhecendo-te, sentindo-me como me senti irmanado em confiança e amizade naturais, coisa de instinto humano, coisa bela quando acontece como, ontem, nós connosco descobrimos e partilhamos. E sabes que mais? falei do 'tal' tema, até mote do nosso encontro e meu pânico privado pelo uso e abuso recorrente nos meus anais recentes, sem sentir a náusea de overdose de que me queixei. Obrigado também por isso Sheila, remufanei sem as penosas dores de olhar o passado como roteiro ou guião, sem, muito menos, falar da minha cidade com o profundo medo de fazê-lo sem essa ilusão narcótica que é o passado.
Se um dia "lá" regressar, uma das pessoas de quem gostaria de sentir os passos tacteando ao lado dos meus, és tu: nunca me sentiria um estrangeiro ou exótica peça turística avulsa, sabendo que esse teu pulsar(á-la) é tão irmão do meu íntimo tremor ao reamá-la.
(a foto não é de Manchester nem de Almeirim, e não sei quem a tirou. olho-a, acaricio-a, estimo-a. e ora divulguo-a, mostro-vos como é linda "a nossa cidade")

domingo, agosto 13, 2006

carros portugueses - 10

O Olda (1954)

(tenho mais três fotos, todas de muito melhor qualidade; por qualquer razão que não adivinho não estou a conseguir inseri-las. tentarei mais tarde, ou em post autónomo)

quinta-feira, agosto 10, 2006

tanto em 14 anos!


tanto, tanto, tanto!
Repara que sorrio quando te escrevo, te vejo meu espelho, e tremo, tremo por tanto te amar e desejar que sejas sempre feliz! pequenita, só assim: amo-te, ser teu pai é sentir-me afortunado e inseguro, tal o tamanho do tesouro que me dás quando abres a tua arca e me dás a mão, uma carícia, sorris e dizes que gostas muito de mim. Incho, cresce-me um rubor por tanto ter, logo a seguir o orgulho de ser tanto o que me dás, tanto! Adoro-te miúda. Em catorze anos tanto sorrir e tanta ternura que me ensinaste, tanto que me deste. Cúmplice, sussurro-te mais uma vez: quero ser sempre o teu maior amigo.
Hoje, 10 de Agosto, PARABÉNS CARLA!
(esta foto foi tirada - e arranjada - por quem eu sei que também gosta muito de ti: a nossa Amiga Theo.)

quarta-feira, agosto 09, 2006

carros portugueses - 9



O Patente 3607. Nunca foi construído mas, em planos - e patenteados..., é este o 1º carro português: 1901.

carros portugueses - 8




O Prozé

Quanto à autoria das imagens, aqui explico-me bem.
Memórias by Google Earth

terça-feira, agosto 08, 2006

papéis da vida

Odeio papéis. Vou explicar-me melhor: odeio o trabalho que faço, o que os papéis que produzo fazem às pessoas que os recebem. É um pequeno passo para o permanente e deliberado atraso, o pejo, o nojo que sinto em cada "processo" que pego, que me cai em cima da secretária. Esse pequeno passo já há muito que foi dado e, hoje, só um salto de gigante poderá acertar o passo aos (meus) papéis. Eu, metro e setenta e quatro e barriguita de cinquenta anos, duvido que o consiga dar.
Olho os 'montes' com ódio, as lombadas na estante que não são anónimas pesem os discretos números que as identificam. Sou o carteiro das más novas, o "filho-da-puta" da terra. Odeio também esse retrato que os papéis dão de mim, cada assinatura que faço, cada registo postal, cada molho de fotocópias que agrafo, cada raiva que em mim cresce quando trabalho nestes papéis. Desculpem o desabafo. Estamos em Agosto, época óptima para pôr "papéis em dia". Corri o Junho e o Julho pensando nisso e fazendo promessas a mim mesmo que, intimamente sabia, não iria cumprir. Não sou capaz, pela sua natureza e pela quantidade. Não tenho pernas para este salto, pequeno passo para assinantes de cruz e abismo para quem lê nomes e imagina caras antes de os assinar. Porque não desisto? porque não parto para outra, como soe dizer-se, outros papéis, assinaturas mais suaves, envios postais menos dolorosos? Porque não posso, o 'sistema' não o permite: só se passa a pasta a outro se "o serviço estiver em dia". Meio Agosto já lá vai e o pequeno passo permanece enorme, os montes olham-me, eu olho os odiados papéis.
O que aqui digo em voz alta (mas escondendo os papéis pois envergonho-me deles) disse-o em confidência a muito poucas pessoas, aquelas que entendi que poderiam compreender esta prisão, meu drama profissional que não tem horário nem descanso e vive comigo lado-a-lado cada minuto que passa, cada papel que me olha, cada relutante assinatura que expeço, devidamente AR e registada. O pequeno passo. Dei-o, já o disse. Hoje é um buraco e precisaria da vara do Bubka para o saltar. Agosto, mês de tréguas: depois virá Setembro, por certo o adiado mês da vingança dos papéis. Odeio-os, há papéis que são implacáveis.
Serei um mau saltador e pior profissional mas gostava de ser recordado como um bom homem.
(a papelada da foto estava aqui. a outra, a 'minha', anda por aqui... olho-a e ela olha-me)

domingo, agosto 06, 2006



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"(O patrão Vasques.) Lembro-me já dele no futuro com a saudade que sei que hei-de ter então. Estarei sossegado numa casa pequena nos arredores de qualquer coisa, fruindo um sossego onde não farei a obra que não faço agora, e buscarei, para a continuar a não ter feito, desculpas diversas daquelas em que hoje me esquivo a mim. Ou estarei internado num asilo de mendicidade, feliz da derrota inteira, misturado com a ralé dos que se julgaram génios e não foram mais que mendigos com sonhos, junto com a massa anónima dos que não tiveram poder para vencer nem renúncia larga para vencer do avesso. Seja onde estiver recordarei com saudade o patrão Vasques, o escritório da Rua dos Douradores, e a monotonia da vida quotidiana será para mim como a recordação dos amores que me não foram advindos, ou dos triunfos que não haveriam de ser meus."
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"O Livro do Desassossego", Bernardo Soares
(a foto de Fernando Pessoa foi gamada aqui)

trinta anos depois: eu


Gostava de voltar a Maputo. A uma cidade que psicologicamente quero reconhecer, que quis minha aos dezoito e onde hoje não conheço ninguém. De mim vazia, sem cantos que chame meus, e onde as esquinas que encontrarei são mais momentos para nelas assentarem os silêncios das memórias, de quando elas eram tão diferentes que quase já delas se não reconhecem as inscrições nas pedras, que para um presente sem histórias para me contar, mudo no falar-me dos carinhos das manhãs e as suas ruas contarem-me dos cresceres de ontem e de antes de ontem. Um vazio de trinta anos sem registos, espaço de memória que não se recheia só porque se lhe sentiu o vazio, um buraco inteiro para encher, escrevendo-o. Como se escrever o passado não é mentir, como se gabar 'estes' deliciosos rissóis ou as lindas pernas 'daquela’ pita não sejam factores subjectivos e volúveis, perenes como é a fé na eterna dose certa de tempero ou a é no brilho do bronzeado durante todo o longo ano: trinta anos são muitos álbuns de fotografias arquivados. Voltar também o eu-agora, naturalmente aos cinquenta anos melhor leitor que então, impulsivo e umbigista. Voltar, pensar-me. Voltar a Maputo ou ao ponto onde fiz clique, uma opção?
Não a imagino, nova cidade: digo a todos que o seu presente não me espantará e não entrarei no perigoso jogo do passado; porque o receio, o medo, é pelo silêncio. Temo-a por não querer sentir nela o mesmo que em Punta Umbría, e pensar que os espanhóis escureceram de repente. De cirandar à procura de pontos turísticos, os globais e os pessoais, esconder-me atrás duma figura, um cliché, uma multidão que faz a sua 'Meca' pós-colonial. Ousar referir um dia, em conversa, que "fomos a Sevilha e a Maputo, tenho umas fotos porreiras". Temo-o, dar comigo assim, velho vencido pelo fim da inocência da juventude.
Mesmo assim gostava de lá voltar para, olhando a baía, ter uma conversa comigo mesmo; utilizando o verbo curriculado como defesa e ânimo, dose pessoal de auto-coragem para me sentar na marginal ou num jardim das 'barreiras', e reconhecer calmamente até que ponto tenho mentido sobre o porquê de lá querer voltar. Fechar os olhos e fechar também um livro que tem tantos anos com páginas em branco. Depois sigo os elefantes: está feito, rasguei a foto.
(composição fotográfica da pitinha Ro)
(nota cerca de duas horas após a postagem: alterei umas frases. acho que está melhor, 'conta' melhor)

quarta-feira, agosto 02, 2006

na gávea do olhar


O porta-aviões atracou no Maine, numa ilhota qualquer que Stephen King ainda não contou. Ideal para isso, porto lento e morno. É a segunda vez num ano, não é paragem habitual mas já há na memória da marujagem o suficiente sorrir de expectativa para o barco todo ser um zum-zum gigantesco antes de atracar: lembram-se da pequena cidade e das lindas raparigas, o fascínio que da outra vez foram as fardas e as sorridentes cabeças rapadas. Fizeram fila para a tosquia e foram ao ginásio dar um toque aos bíceps e aos peitorais, atracaram, atropelaram-se para o cais, a pequena cidade, telefonaram à família e aos amigos entre duas cervejas e um beijo, enquanto o velho barco ganhava fôlego para mais outro voo, já um nadar fatigado. Ele, suspirando entre jactos de fumo, resfôlego cansado, deitado ao longo do agora ainda mais pequeno cais, sua cama quando visita o Maine e as suas cidades que a ficção ainda não contou. Eles, suspirando olhos bonitos e quentes, pés na terra firme da côrte ansiosa dos vintes, fogosos vintes, ardentes vintes marinheiros, especiais. O porta-aviões apitou, resfolegou, satisfeito: os seus meninos estavam a brincar, felizes! Como é belo, até poético, o olhar do marinheiro que espreita a terra e solta planos de euforias à mistura com a sua cabeça rapada na farda branca... loucos e sequiosps por festa, cerveja, talvez sexo, os sonhos e os planos tão perfeitos e românticos como só um marinheiro de vintes, cabeça rapada, os poderá imaginar: é clássica a imagem mas sempre entusiasmante, injecção de adrenalina e de vida na linda e pequena cidade, o cais tão pequeno quando o porta-aviões lá atraca. Na memória dum galeão que recolhia as velas e soltava o seu brado no chiar das madeiras e das cordas por festa, mulheres, vinho, antes um drakkar vikingue, ou sempre que uma proa, saudosa, beija o cais e o barco e a cidade namoram.
Há um dar de mãos especial entre o romance e o mar, velha história de marinheiros e namoradas de marinheiros, porto a porto se conta uma tradição, soa a sirene do desejo, enfunam e enchem o horizonte as velas da aventura. Amor e mar, a mais bonita canção de marinheiro.
(gamei a foto do barquito aqui.)